Recentemente, uma declaração conjunta de vários líderes religiosos declarou ser comum a todos os credos e convicções uma cultura fundamentalmente contrária à Eutanásia. Este acontecimento, verdadeiramente histórico, revela que malgrado as diferenças próprias a cada crença, todas possuem uma posição comum em matéria de respeito pela vida dos mais frágeis. Isto significa que nas raízes basilares das várias sociedades e povos, que se multiplicaram e desenvolveram nos cinco Continentes, está uma convicção que respeita o doente, o idoso, e que preza pela vida dos desvalidos. Embora guerras provocadas essencialmente por motivos político-sociais tivessem interrompido a preservação da vida a tantos homens e mulheres inocentes, doutrinariamente, as religiões sempre garantiram o cuidado e a atenção com os anciãos e os enfermos. A pena de morte poderá até estar prevista em muitas nações, mas ela é destinada aos criminosos, não aos mais frágeis da sociedade. A eutanásia rompe com uma cultura que edificou os princípios que norteiam o mundo, tal como a conhecemos, para introduzir a morte por opção, o suicídio assistido. O direito à vida, é uma realidade da Declaração Universal dos Direitos Humanos. O direito à morte tornou-se a lúgubre lei a ser introduzida hoje.
Mas não são apenas os princípios morais das religiões contrários à Eutanásia. Também a ética profissional, sobretudo dos agentes de saúde, é contrária à morte provocada do paciente. O juramento feito pelos médicos desde o século V e que se crê ter sido criado por Hipócrates, pai da medicina ocidental, recebeu atualizações em 1983, de acordo com o documento publicado pela Ordem dos Médicos em Portugal, mas continuou a garantir o respeito absoluto pela vida: “Guardarei respeito absoluto pela Vida Humana desde o seu início, mesmo sob ameaça e não farei uso dos meus conhecimentos Médicos contra as leis da Humanidade”.[1] A fórmula estreada recentemente, em 2017, trocou a palavra absoluto por máximo: “Guardarei o máximo de respeito pela vida humana”,[2] mas ainda garante a fidelidade aos direitos humanos prometendo não usar os conhecimentos médicos para violá-los. Ora, para o juramento de Hipócrates não se tornar dos hipócritas, talvez a Eutanásia tenha de vir a ser realizada por médicos que a partir da publicação da lei abandonem esse juramento que durante XV séculos testemunhou uma vocação entregue à pessoa e à saúde, pois só é pessoa quem está vivo, e só o vivo é passível de saúde. Passariam os futuros médicos e os hipócritas de Hipócrates a ser agentes da saúde e da morte, do tratamento e do suicídio, fator que, a julgar pelas declarações do atual Bastonário da Ordem dos Médicos, que já se declarou contrário à eutanásia, muitos não querem sujeitar a sua honra.
Diante de grandes prioridades dos nossos dias, tais como a multiplicação e garantia dos cuidados paliativos e a atenção com os idosos, cada vez mais numerosos e com uma esperança média de vida aumentada, e o respeito, atenção e acolhimento que lhes deve ser devotado pelo Estado, para quem contribuíram toda uma vida, além da família, que se vê pelas imposições sociais muitas vezes distante dos seus familiares anciãos, a eutanásia parece não ser um problema que se imponha agora à sociedade, embora alguns extremistas a queiram impor à força para satisfazer os seus planos de desconstrução de toda uma ordem moral e social Ocidentais. Incoerentemente, num momento em que tanto se esforçam pelo endurecimento da criminalização do abandono e dos maus tratos dos animais, e não se preocupam com o abandono dos idosos (abandonar um animal é um crime, mas um idoso, de certa forma, não). No qual lutam para que não matem os animais doentes e abandonados nos canis municipais, mesmo a nível mundial,[3] mas querem “o abate” dos doentes e idosos nos hospitais. A eutanásia é contrária a todas as religiões, à moral, à ética médica, à ordem social, à caridade, ao pensar de muitos crentes e não crentes. Para os extremistas pouco importa, contra tudo e quase todos, parece que eles vão aprovar a lei… Que também façam bom proveito dela. Dizem que Guillotin, o médico que criou a guilhotina durante a Revolução Francesa, instrumento de morte rápido e eficaz, com pouco sofrimento, também teve posteriormente a sua cabeça separada do corpo. Acabou por inventar a sua própria morte…
P. José Victorino de Andrade
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[1] http://ordemdosmedicos.pt/wp-content/uploads/2017/08/Juramento_de_Hip%C3%B3crates.pdf
[2] https://www.dn.pt/sociedade/interior/novo-juramento-dos-medicos-e-estreado-em-portugal-no-domingo-8923582.html
[3] Ver o artigo neste site: https://aportesdaigreja.com/2017/07/19/sera-o-homem-descartavel-incoerencias/
Ver outros artigos sobra a eutanásia neste site:
https://aportesdaigreja.com/2018/03/14/os-interesses-que-se-escondem-atras-da-eutanasia/
https://aportesdaigreja.com/2018/02/23/anestesiando-a-pessoa-e-mais-facil-matar/
https://aportesdaigreja.com/2017/07/19/sera-o-homem-descartavel-incoerencias/
https://aportesdaigreja.com/2018/01/03/profecia-e-testemunho-cristao-nas-atuais-democracias/
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