Os animais do mundo e o mundo dos animais

baiano-e-quila.jpgNesta fotografia estão recordações pessoais. Dois lindos e muito bem tratados animais. Tive, entre outros cães, pássaros, tartarugas, peixes, dois patos e até várias ovelhas, um lindo pastor alemão e um fila brasileiro. As imagens falam por si. Os animais bem tratados, bem nutridos, estimados, mas não idolatrados. Uma vez que também eu possuí quase sempre animais de pequeno e maior porte, penso que também me sinto abalizado a entrar na presente discussão sobre a responsabilidade por este dom de Deus que devemos preservar e cuidar. E enquanto sacerdote católico, não poderia deixar de apresentar a visão cristã como a mais sensível e equilibrada nesta matéria, pois na exclusividade de um só Deus, não posso reconhecer na presente zoolatria de fanáticos e religiosos seguidores de bichos uma equilibrada e ordenada solução para o problema do desrespeito do ser humano pelas criaturas que connosco partilham esta terra. Conheci a serra e o campo, a cidade e o litoral, convivi com múltiplas culturas e povos, em lugares com animais perigosos e peçonhentos, e junto a ternurentos bichinhos, passando pelos animais de trabalho (as ovelhinhas eram as minhas cortadoras de relva), aqueles que acabavam no prato (os comestíveis) e outros de companhia. Matei aranhas e escorpiões, apanhei cobras, afastei macacos das minhas frutas e janelas, armadilhei ratos e ratazanas nas ratoeiras, fumiguei parasitas que invadiam a terra e o pêlo dos animais, dei raquetadas elétricas nos mosquitos portadores da dengue e da chicungunha…

Saber lidar com animais, é saber que não damos carícias a todos, e que há alguns mais atrevidos ou perigosos que temos de encurtar-lhes a vida antes que eles encurtem a nossa. A vida do homem está acima do animal, não enquanto tirania, mas enquanto dom e responsabilidade. A defesa que se faz de um indefeso animal deveria começar pela nossa humanidade, mas hoje há animais e até vegetais protegidos por lei, enquanto fetos humanos são exterminados a belo prazer de animais que parecem irracionais ou pelo menos desprovidos de um coração. É uma inversão de valores, pelo qual se há 20 anos estranhávamos o absurdo de um slogan que dizia: “não maltrate o seu animal, pois ele também é gente”, a humanização do animal e a animalização do homem levam a que talvez hoje não estranhássemos a necessidade de inverter a formulação e dizer: “não maltrate o homem, pois ele também é um animal”. Elevaram os bicharocos a uma tal condição que num passado recente os mesmos políticos que procuraram criminalizar a destruição dos ovos de avestruz logo a seguir descriminalizaram o aborto, e mais tarde criminalizaram o abandono dos animais para pouco depois não criminalizarem o abandono dos idosos. Lógica? Nenhuma… é a tirania do politicamente correto no contexto dos novos direitos que deixaram de ser universais, mas pertencem agora aos animais, irracionais. Será que no futuro, dos bebés no ventre aos idosos, dos doentes aos pobres e descriminados, teremos todos de reclamar os mesmos direitos que os animais progressivamente estão a alcançar? Para o Papa Francisco “é necessário constatar que, no decorrer dos anos, a interpretação de alguns direitos foi mudando progressivamente, a fim de incluir uma diversidade de novos direitos, muitas vezes em oposição um ao outro. Abre-se assim, uma série de problemas que envolvem profundamente a ideia de direito e os seus fundamentos”.[1]

Existe uma tal variedade na Natureza, que ter um cão ou um gato num apartamento não forma nem dá a especialização a ninguém em matéria de direitos dos animais. Aliás, se eles tivessem verdadeiros direitos, talvez alguns apertados cubículos onde eles passam o dia sozinhos fizesse dos seus proprietários grandes vilões da natureza e da liberdade própria à espécie de cada um dos animais de companhia. Ou o condicionamento e cruzamento das espécies para termos fofuras peludas ou carrancudas. Ou mesmo tosquiadas, por motivos estéticos e pouco éticos à moda do penteado dos donos, e quem entende do assunto sabe serem certos cortes prejudiciais aos próprios animais. Ademais, cães e gatos, não são os únicos animais que nos rodeiam, e com muita facilidade os  ditos defensores dos bichos dizimam todos os invasores que começaram a invadir a dispensa tornando-se audazes para exterminar todo um formigueiro, dar uma vassourada na osga que entrou pela janela (ninguém gosta de ter um jacaré de parede em casa), ou até mesmo pontapear um velho piolhoso rafeiro que já pensa em pular para cima da cadelinha acabadinha de sair da tosquia e da banhoca do pet shop… Lamento desapontar, mas as festinhas que se fazem no bichinho e a alegria do peludinho não transformam ninguém num capacitado defensor dos animais. Não é o feno e a soja transgénica que comem, ou outras ervas que consomem, que está a alimentar e inspirar alguns ideólogos dos direitos dos animais, mas as filosofias utilitaristas de Peter Singer entre outros autores que visam um projeto globalista de tribalização e redução da humanidade, e que escrevem tantos livros baratos e patrocinados sobre a ética animal. Os grandes especialistas não são definitivamente os donos dos cães e dos gatos dos apartamentos, nem filósofos indrominados, mas aqueles homens e mulheres do campo que desde sempre lidaram com animais selvagens, de companhia, de trabalho e com o potencial alimento fornecido por eles. São os que afastam lobos e raposas do rebanho e do galinheiro, os pássaros das sementes, que têm de ver se no sapato não entrou nenhum lacrau, ou qualquer cobra no estábulo, que tratam do porquinho para terem um bom chouricinho, no milho das galinhas engordam o cozinhado, levam o gado a pastar e a sulcar, e dele obtêm leite, carne e indiretamente tantos produtos agrícolas. Alguns andam a cavalo ou de carroça e não poluem. Compram, vendem, criam, matam, preparam, vendem, comem… Não há maiores entendidos e respeitadores pela vida animal, pois dela dependem, e para ela vivem. Movem as já tão parcas economias dos nossos interiores, tal como mantêm o autossustento de muitas famílias. Dão graças a Deus pelo que têm e não endeusam os animais com que se entretêm.

José Victorino de Andrade

 

Ler mais sobre esta questão noutro artigo:

https://aportesdaigreja.com/2018/08/10/o-equilibro-ecologico-perde-se-no-extremismo-ideologico/

__________________________

[1] In: https://www.acidigital.com/noticias/papa-francisco-preocupado-com-as-contradicoes-dos-novos-direitos-29749

1 thoughts on “Os animais do mundo e o mundo dos animais

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  1. Nossa Senhora conceda a humanidade, sabedoria, para refletirmos sobre questões agudas, que requer reflexão e mudanca de atitudes.
    Vossa benção,Revmo Padre José Vitorino Andrade

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