“O Espírito abre à inteligência humana novos horizontes que a ultrapassam, e proporciona-lhe compreender que a única sabedoria verdadeira reside na grandeza de Cristo”.1 A inteligência é a faculdade pela qual o homem percebe a essência das coisas. Atinge o imaterial, embora dependente das faculdades sensitivas que lhe fornecem os elementos a percecionar. Consequentemente, aos homens foi dada a possibilidade de chegar ao conhecimento do Criador pelas criaturas (Sb 13, 5) e, graças à inteligência, todos têm a possibilidade de “saciar-se nas águas profundas” do conhecimento (Pr 20, 5).
É sobejamente conhecida a expressão de Santo Agostinho: “intellige ut credas, crede ut intelligas”.2 Perscruta-se a verdade para poder encontrar Deus e crer, ao mesmo tempo que o crer abre caminhos. A inteligência não deve eliminar, mas esclarecer a Fé, para que em restituição a inteligência seja também a recompensa do que crê. As duas fórmulas expressam a síntese coerente entre fides et ratio, cuja harmonia “significa sobretudo que Deus não está longe”.3 A inteligência é um dom de Deus que, entretanto, deve ser reconhecida como limitada. A nós cabe procurá-Lo parando, todavia, diante do mistério. Deus, sendo infinito, supera toda a perspetiva humana. Deve haver por isso um abandono confiante no Seu projeto.4 Embora possamos conhecer a Deus pela razão, deve-se à Sua Revelação o conhecimento sem erro. São as Sagradas Escrituras que contêm a palavra de Deus e por isso, o estudo destes sagrados livros deve ser como que a alma da sagrada teologia.5 “Porém, o encargo de interpretar autenticamente a palavra de Deus escrita ou contida na Tradição foi confiado só ao Magistério vivo da Igreja, cuja autoridade é exercida em nome de Jesus Cristo”.6 A todos os demais compete, de acordo com o Codex Iuris Canonici, que “sigam a sólida doutrina fundada nas Sagradas Escrituras, transmitida pelos antepassados e comumente aceita pela Igreja, conforme está fixada principalmente nos documentos dos Concílios e dos Romanos Pontífices, evitando profanas novidades de palavras e falsa ciência”.7
A inteligência humilde inclina-se diante das verdades da Fé, a arrogância néscia gosta de contradizê-las, de profanas novidades e da falsa ciência… Aqueles que são muito inteligentes, compreendem as limitações impostas à sua natureza e a necessidade de uma autoridade que os oriente. Se católicos, inclinam-se diante da Igreja, dos dogmas e dos ensinamentos contidos nos documentos do Magistério. Quantos santos proclamados doutores pela Igreja não se encontram nestas fileiras? Há também os inscientes de bom espírito: estes reconhecem que a verdade vai muito além deles, e chegam mais longe pelo esforço, pela admiração e pelo amor. Quantos santos não se encontram também entre estes com a sua doutrina reta, simples, sublime… Por fim, há os que se acham inteligentes, ou os arrogantes (muitos doutores, mas nenhum santo): gostam de ser eles a ditar as verdades e de contradizer toda e qualquer autoridade; não gostam dos dogmas, a não ser daquelas formulações complicadas e vazias inventadas por eles. Entre estes, os hereges abundam.
Já D. Hélder Câmera dizia não temer nem os sábios nem os ignorantes, mas aqueles que pensam que são inteligentes… e não são.
Pe. José Victorino de Andrade
in: LUMEN VERITATIS, n. 4, jul-set, 2008, p. 3-4 (Adaptado).
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1) BENTO XVI. Vigília de oração com os jovens. Basílica de Notre-Dame, Paris. 12 set. 2008.
2) Sermones, 43, 9.
3) BENTO XVI. Audiência Geral. 30 jan. 2008.
4) Cf. JOÃO PAULO II. Homilia. Roma, 26 mai. 1979.
5) Cf. Epist. ad Diognetum, c. VII, 4: Funk, Patres Apostolici, I, p. 403.
6) Dei Verbum 10.
7) Codex Iuris Canonici, cân. 279, § 1.
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