Era ainda um jovem acólito quando, certo dia, vi o nosso pároco chegar à celebração eucarística triste e acabrunhado, facto que não foi imperceptível à assembleia. Pensava o povo que talvez estivesse doente ou com algum problema. O padre não é um super-homem e está sujeito às contingências e fragilidades humanas, tão características de um filho de Adão. O sermão não fugiu às leituras, mas as últimas palavras na ação pareciam ser as primeiras na intenção. Um desabafo… depois de tantos anos de visitas às crianças da escola da região, para lhes falar da Fé e de Jesus, as portas fecharam-se-lhe em nome da Escola e do Estado laico. Isto, para os seus cabelos brancos, não era novidade. Havia nascido nos períodos conturbados da primeira República e sempre soube que a Igreja e o Estado foram separados por sucessivas leis que acabariam por extrair até o nome de Deus da Constituição. Mas isso nunca havia significado que uma vida comprometida com Cristo, gasta pelos mais necessitados, com um sorriso a testemunhar, ficasse fora da laica escola.
Surpreende um pouco que a escola tivesse começado a descobrir que é laica quase um século depois, ou que entendesse que, para sê-lo, seria necessário excluir Deus do ensino. Tornar-se-ia laica para acolher a todos, menos um, em nome do respeito ou da diversidade, a partir da exclusão. O estabelecimento de ensino não está chamado a ser confessional do ateísmo ou a propagá-lo como modelo humano ideal. A sã laicidade consiste no acolhimento e convívio com todas as realidades que importam para o crescimento integral do jovem, sem esquecer a sua sede de absoluto, que o leva a tantas radicalidades, por vezes desvirtuadas. O despertar de um senso crítico e analítico em todas as dimensões, até mesmo no campo religioso, não beneficia da negligente ou parcial inclusão em matéria escolar dos seus conteúdos e da sua História, que fazem parte dos nossos fundamentos e tradições. Até para a escolha da Fé ser verdadeiramente livre, ela deve partir de uma opção consciente e não ser condicionada pela ignorância e pelo desconhecimento.
Fica comprometida a inserção do jovem na sociedade plural quando carente da compreensão da originária solidariedade e caridade que a edificaram. Não deveria a escola romper com a religião que não começa na Igreja, mas em casa, na família, como lembra o Papa Francisco na Amoris Laetitia, e se quiser ser um prolongamento do lar, não descurar a educação moral e religiosa para a qual a Igreja tem um importante contributo.
Pe. José Victorino de Andrade
In: O Domingo (adaptado)
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