A Ideologia de Género como um género ideológico

Aqui há gatoGato que nasce no forno não é biscoito. O engraçado ditado que ouvi várias vezes no Brasil transmite-nos uma verdade simples e direta. Não é pelo bichano nascer nesse espaço insólito que o torna um biscoito, mas permanece um bicho peludo de quatro patas e bigodes, um mamífero da família dos felídeos, topo de uma cadeia alimentar enquanto predador, ou seja, um gato, e não um snack crocante e adocicado. Parece básico aquilo que estou a escrever, mas neste mundo estranho em que aquilo que é e parece, nem sempre se reconhece, penso que constitui um aporte introdutório. Eu até posso apelidar o gato de Biscoito. À perceção de todos, será um gato. E comportar-se-á enquanto tal. Básico! Ora, não quanto aos felídeos, esses não têm crises de identidade, mas aos homens, parece haver hoje uma crise identitária: alguns não se reconhecem em quem nasceram e são. A confusão é de tal modo, que presentemente não se limita à troca dos sexos, masculino e feminino, mas à possibilidade de diferentes géneros possíveis: ao que consta, cerca de 56. A confusão não será científica ou biológica, mas ideológica. Negando a verdade conhecida enquanto tal, a pessoa pode querer que a identifiquem com um animal, um vegetal, um alienígena, uma criança, transformar o corpo, comportar-se e disfarçar-se de forma extravagante e anormal. E da mesma forma relacionar-se com as criaturas mais variadas, mesmo de natureza diferente, mineral, vegetal, animal, ou espiritual… Assim, pessoas que querem casar com árvores, espíritos, bonecas de plástico… Uma curta procura em sites de notícias, levar-nos-ia facilmente a tais extravagâncias do homem dito livre e pós-moderno.

Quanto mais o homem progride na técnica e na ciência, e regride no conhecimento de si, mais acaba por empobrecer-se no ser. Alertava Kierkegaard para o perigo do homem “se extasiar com as descobertas e a genialidade, sem, no entanto, conseguir compreender-se a si mesmo”.[1] E como a ética científica reduz-se atualmente a um simples: é possível, então faça-se –, coloca-se ao serviço de muitos interesses hedonistas e individualistas. O utilitarismo político que oferece a satisfação pessoal em troca de votos, não poupa esforços para satisfazer os mais extravagantes caprichos. Assim, alguns Estados passaram a comparticipar remédios e hormônios que bloqueiam a puberdade (como se fosse uma doença, quando faz parte da natureza), mesmo tornando os jovens estéreis, para mais tarde fornecer hormônios do sexo oposto. Cirurgias estéticas são também realizadas para que as pessoas não vivam frustradas. Verdadeiras loucuras pagas pelo erário público em muitas nações. É curioso, mas por mais cirurgias que façam e químicos que tomem, as carnes serão comidas pelos vermes, e os ossos revelarão aquilo que sempre foram. Qualquer arqueólogo no futuro, analisando a estrutura óssea, identificaria com muita facilidade o género e a espécie. Assim, não adianta um individuo querer ser um lagarto, como por aí existe, tatuar o corpo de escamas e fazer uma cirurgia à língua para dividi-la em dois, identificando-se como um réptil; ou um homem fazer crescer o peito e o cabelo e dizer que é uma mulher: exterioridades acobertadas por ideologias. Um dia, exumando o corpo, um simples coveiro reconhecê-los-á como um individuo adulto do sexo masculino, não um réptil, nem uma mulher. O problema, mais uma vez, não é biológico, mas ideológico. Apesar de por alguns negada, hoje é reconhecida e denominada como: ideologia de género. De acordo com o Papa Francisco, precisamos estar alerta para a presente colonização ideológica.

O Catecismo da Igreja Católica ensina-nos que “cabe a cada um, homem e mulher, reconhecer e aceitar sua identidade sexual” (n. 2333). Segundo a socióloga alemã Gabriele Kuby, a ideologia de género “é a mais radical rebelião contra Deus que é possível: o ser humano não aceita que é criado homem e mulher, e por isso diz: ‘Eu decido! Esta é a minha liberdade!’ — contra a experiência, contra a Natureza, contra a Razão, contra a ciência! É a perversão final do individualismo: rouba ao ser humano o que lhe resta da sua identidade”.[2] O sujeito acaba então por negar uma verdade que determina uma realidade, e sustentado por uma ideologia que extravasa os domínios da biologia, em nome das liberdades individuais que escondem totalitarismos utópicos e materialistas, nutrir sentimentos que pretendem superar a sua própria natureza e transformá-la a seu bel-prazer. E impô-la aos demais, limitando as liberdades alheias numa verdadeira ditadura ideológica. Não adianta que me exijam que eu diga que é uma mulher se eu vejo diante de mim um homem. A liberdade do outro termina onde começa a minha, e se a minha perceção me diz que eu estou diante de um homem, não é um documento alterado e um peito insuflado que me vai obrigar a dizer que se trata de uma mulher, pois o totalitarismo ditatorial do género não pode ter autoridade sobre o sacrário da minha consciência. O que o outro faz ao seu corpo, não me pertence. Mas obrigar-me a dizer que ele é o contrário do seu ser e da minha perceção, toca na minha liberdade e na subsistente verdade. E isso já não é com ele, é comigo, é com todos. Se ele tem liberdade para alterar o seu corpo, eu tenho a liberdade de não concordar e de lembrar a verdade original dos cromossomas que não se alteram. Porque não basta a pessoa parecer e dizer, é preciso ela ser.

P. José Victorino de Andrade

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Aconselho um artigo muito interessante, de onde tirei algumas ideias, e que complementa este texto, de um colega também ele Doutor em Teologia Moral, Pe. Mário Marcelo Coelho, scj no site: https://www.a12.com/redacaoa12/duvidas-religiosas/o-que-se-entende-por-ideologia-de-genero

[1] REALE, Giovanni. História da Filosofia: Do romanismo até nossos dias. V. 3. São Paulo: Paulus, 1991. p. 250.

[2]Apud http://sofos.wikidot.com/ideologia-de-genero

3 thoughts on “A Ideologia de Género como um género ideológico

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  1. Caso alguém se entenda com um gênero diferente do sexo, não é possível desvincular o psicológico do biológico, pois temos hormônios e um formato de corpo… Até junho de 2018 a OMS considerava a transexualidade como um distúrbio, ou seja, um transtorno de saúde mental. Posteriormente a OMS trocou a palavra “distúrbio” por “incongruência”. Na prática, isso é um reconhecimento que os transgêneros passam por um constante conflito psicológico.

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