A Bioética não deve excluir fundamentos metafísicos e teológicos

NazareUma vez que as raízes cristãs do Ocidente são um facto histórico inegável e incontornável, a moralização dos povos está na base de uma construção civilizacional que veio a sofrer forte ruptura quando quis dissociar a moral da religião e fundamentá-la na mera razão. Kant não é um nome estranho, nesse sentido. De acordo com Elio Sgreccia, o “silêncio da metafísica”, deu lugar ao relativismo, a uma ética racionalista laica, que não deveria deixar de se confrontar com o absoluto, pois a razão pede ao homem que se confronte com valores humanos e normas éticas cuja origem é transcendental.1 Advertia também Jorge Teixeira Cunha que a falta de confrontação com a evidência metafísica e o Absoluto nos pressupostos desta matéria, leva a um “bater de asas no vazio de uma egolatria sem horizonte”, pois “justificar racionalmente a norma do bem moral” não deve excluir, quanto ao seu juízo, a consideração do pensamento religioso e teológico cristão.2

Não nos podemos esquecer que temos como fundamento da nossa sociedade todo um património, também ele moral. O problema é que muitas vezes certas premissas válidas, imutáveis e perenes são esquecidas ou deliberadamente postas de lado, em nome de certa cultura apelidada de moderna, sobrepondo-se o novo e despojando-se o existente. Porém, aquilo que tem o seu fundamento em Cristo goza de uma perenidade, que apenas deve ter em vista as diferentes maneiras e riquezas de serem apresentadas às várias culturas. A Lei moral da Igreja possui as suas raízes em Nosso Senhor, portanto, na lei Eterna, além de estar também fundamentada na lei inscrita no coração dos homens, a natural. Uma ética sem qualquer fundamentação teológica ou metafísica estará sempre sujeita a interesses alheios e às frágeis bases do compromisso social.3

De acordo com Elio Sgreccia, “a experiência cristã e o Magistério da Igreja, Católica com senso de realismo na consideração do homem – sujeito ao egoísmo e ao pecado – chamam a luz da Revelação a esta causa [da lei natural], não só como útil, mas de facto necessária, para a plena compreensão do bem humano no seu todo”.4 Ademais, a ética cristã destaca-se das outras, pois, não se trata de um negócio, de um jogo de interesses ou algo passageiro, mas de um compromisso fundamentado numa ética original e originária, conforme explica Arboleda Mora: “O desafio que se coloca para a ética é fundamental. As posições éticas quotidianas dos cristãos simplesmente se confundem com a ética dominante que pode ser uma defesa conjectural dos direitos humanos. Ou também pode parecer à igreja defender um vago humanismo como qualquer Organização não-governamental. Ou se prega um amor aos demais, universalizante e abstracto sem compromisso da pessoa. A ética não se reduz a ser um ‘bom negócio’. O recurso ao compromisso ético não é questão de ‘imagem’ (pode-se ser ético por ganância ou status) ou de estar na moda, mas de fundamentação e fundamentação numa ética original e originária. Original porque própria ao cristianismo e originaria pois funda toda a acção social no mundo”.5

Entre tantos problemas que afligem a sociedade humana nos nossos tempos, ensina-nos Bento XVI na Caritas in Veritate que “o problema decisivo é a solidez moral da sociedade em geral” (n. 51). Ora, uma sã Bioética, fundamentada nos perenes valores da Igreja, que sirva de firme sustentáculo e corrimão para o Estado, poderá ser capaz de abrir as portas ao verdadeiro Progresso, para a construção do bem comum, e da civilização do amor.

Pe. José Victorino de Andrade

TCC Bioética – UPB (Adaptado).

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1 Cf. SGRECCIA, Elio. Manuale de Bioetica. 4. ed. Milão: V&P, 2007. Vol. 1. p. 30.

2 Cf. TEIXEIRA DA CUNHA, Jorge. Bioética Breve. Apelação: Paulus, 2002. p. 6.

3 Algumas ideias deste parágrafo estão fundamentadas na conferência feita pelo Arcebispo Jean-Louis Bruguès, abordando a Encíclica de João Paulo II Veritatis Splendor, no Seminário São Tomás de Aquino (São Paulo – Brasil) no dia 1 nov. 2010. Ver também o nº 53 do documento.

4 SGRECCIA, Elio. Op. Cit. p. 210. Tradução nossa.

5 ARBOLEDA MORA, Carlos. Experiencia y testimonio. Medellín: UPB, 2010. p. 22. Tradução nossa.

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